domingo, 1 de maio de 2016

OS PAIS DE HOJE


Encontrei Vera* outro dia e quase não a reconheci. Seu andar era vagaroso e seu olhar distante. Conhecia-a em minha juventude, no Garcia, quando íamos para o Colégio Central onde cursamos o segundo grau. Fui a seu casamento. Simples e com uma recepção estritamente familiar. Eu era a única pessoa na casa que não era da família. Só um bolo, mas o casal irradiava felicidade. Tiveram dois filhos e melhoraram consideravelmente de vida. Puderam dar uma boa educação aos garotos na qual não faltou o auxílio de uma boa escola. Nos anos que  trabalhei no Colégio Adventista voltamos a nos reencontrar e reatar nossos laços de amizade. Tomei novos rumos e, novamente, vários anos se passaram sem nos vermos. Agora ela contava-me sobre os acontecimentos que transformara sua vida em um lago de decepção e tristeza. Ficara viúva e seus filhos, agora adultos, conseguiram persuadi-la a vender seu bom apartamento no centro da cidade para fixar residência em um bairro mais afastado. Alegaram ser “melhor” para ela. No caminho da compra do novo imóvel parte da quantia se foi em coisas supérfluas que ela nem soube enumerar. O mais novo estava morando com ela juntamente com mulher e filhos. Queixou-se de falta de privacidade para as mínimas tarefas de seu dia a dia.

Vamos a outro caso: Ana* tinha uma casa em uma cidade circunvizinha que não era um palácio mais tinha o conforto necessário para quem já passara por duras batalhas. Sua deficiência física não foi usada como pretexto para desistir de lutar pela vida e ela foi em busca de seus sonhos. Conseguiu tudo que quis mesmo sem a presença de seu companheiro que a abandonara com dez filhos, todos homens.  Ao tornarem-se adultos os mais velhos começaram a trazer suas digníssimas companheiras para dentro de casa. Um puxadinho aqui, outro ali, e, quando ela finalmente deu por si já estava com uma família numerosa que não lhe dava o mínimo sossego. Deixou a casa com eles e foi morar em uma casa alugada longe dali. Não adiantou. Após alguns anos viu-se novamente com a casa cheia porque  os últimos solteiros foram para a nova morada. Todos adultos e trabalhando, conforme ela queixou-se para mim, mas sem contribuir com nenhuma quantia.

Mas o que é que está acontecendo com os pais de hoje? Perderam o rumo, perderam o prumo, perderam tudo. Os filhos mandam e desmandam nos bens que eles tão penosamente amealham ao longo da vida. Conheço um que inclusive está passando por uma grande dificuldade financeira mesmo tendo inúmeros imóveis.  Acontece que ele não vende nenhum porque os filhos o proibiram de desfazer-se de qualquer coisa que eles tenham para herdar. E ele consome suas noites pensando em uma forma de sair da situação em que se encontra. Com a solução logo ali. Não é necessário que ele passe por isso, mas ele alega que não quer criar problemas com os filhos. Para mim, o nome disso é medo de filho!

Amo quando meus filhos se reúnem para rirem das loucuras que aprontavam e de minhas atitudes que muitos classificavam como excessivamente duras. Às vezes não riem, eu sei disso. Mas prefiro que eles reclamem hoje de minhas “durezas” do que das minhas fraquezas.  Dessas últimas, sim, afirmo sem medo de errar que, infelizmente, não posso voltar no tempo para consertar.

 Achei em um dos registros do filósofo e escritor Mário Sérgio Cortella que muitos se preocupam tanto com o que vão deixar neste mundo para seus filhos, mas, que poucos se preocupam com o tipo de filhos que vão deixar para este mundo. Pensemos nisto antes de virarmos aquela página!


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