quarta-feira, 24 de agosto de 2016

O BATEDOR DE CARTEIRAS E O ESCORPIÃO

Acredito que muitos já leram, ou ouviram aquela estória do sapo e do escorpião com o objetivo moral
de fazer uma comparação entre a natureza humana sempre em luta com sua natureza carnal. Mesmo assim transcrevo aqui:                                               
“Um escorpião aproximou-se de um sapo que estava na beira de um rio e lhe fez um pedido:
- Amigo sapo, você poderia me carregar até a outra margem deste rio tão largo?  -  O sapo respondeu: - Só se eu fosse louco! Você vai me picar e eu vou ficar paralisado e afundar.  Disse o escorpião: - Isso é ridículo! Se eu o picasse, ambos afundaríamos e nos afogaríamos.

 Confiando na lógica do que disse o escorpião, o sapo concordou e levou o escorpião nas costas, nadando para atravessar o rio.  Quando chegaram ao meio do rio, o escorpião cravou seu ferrão no sapo.  Atingido pelo veneno, e já começando a afundar, o sapo voltou-se para o escorpião e perguntou: - Por que você fez isto? Agora nós dois vamos morrer!  - E o escorpião respondeu: "Por que sou um escorpião e esta é a minha natureza." 
                       
Lembro-me dessa analogia, toda vez que releio uma situação pela qual passou o cirurgião plástico Ivo Pitanguy no início de sua carreira. Ele contou em várias de suas autobiografias, inclusive em Viver vale a pena, página 64-66, que na década de 1940 a “cirurgia reparadora era considerada desprezível pela comunidade médica”. Achavam-na, segundo suas palavras, fútil, e, até ouviu colegas acusá-lo de “perder tempo com coisinhas”. Bem, a despeito de todas as críticas ele continuou a se dedicar a essa especialidade no que se tornou referência mundial. Para ele sua missão se constituía em ajudar as pessoas que o procuravam a reconstruírem suas vidas através de “uma existência normal mesmo que fosse um delinquente”. E foi assim que certa noite chegou à emergência do hospital em que ele trabalhava um conhecido batedor de carteiras da região central do Rio de Janeiro. Levou horas para recuperar aquela mão tão perigosa. Seus colegas o advertiram-no de ajudar alguém que vivia a serviço do mal. Terminado o serviço Pitanguy relata o diálogo que teve com o marginal:

            - “Espero que guarde bem minha fisionomia e, quando me vir nas ruas do Centro, não venha bater minha carteira”. No que o paciente lhe respondeu com toda seriedade:

            - Sinto muito, doutor, mas nesse caso minha conduta é tão profissional quanto a sua. Quando estou trabalhando, não levo em conta quem é o meu “cliente”.                                                          

Jesus também não levou em conta a sua “clientela”. Muito menos as formas variadas que eles utilizavam para virar suas páginas. O público ouvinte de sua palavra era constituído tanto de ricos, como Nicodemos que o procurou na cada da noite, com vergonha de ser visto, quanto de multidões de famintos em busca do pão material!

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