quinta-feira, 11 de junho de 2015

AMIGO TEM CINCO LETRAS
 Em certa manhã de domingo, fim de verão, em um parque de diversões, fiquei observando uma garotinha aproximar-se com o pai. Enquanto ele desenvolvia uma conversa ao celular a criança corria alegremente em direção a uma gangorra. De repente, noto em sua face um olhar interrogativo que ia de um lado ao outro do parque. Sentada de um lado da gangorra faltava-lhe, do outro lado, alguém para dar sentido àquela diversão. Com o assento apoiado ao chão ela aguardou pacientemente até que chegou uma companheira. Quando esta apareceu pouco brincou e, logo se cansou, deixando-a sozinha novamente. Novo olhar de procura. Neste momento, o pai, que já desligara o celular, percebendo a angústia da filha, correu ao seu encontro e sentou-se do outro lado para dividir a gangorra com sua “cria”. Ao contemplar esta cena lembrei-me de que, em minha adolescência, não poucas vezes eu supliquei a Deus que me enviasse alguém para me ajudar a dividir a “gangorra” da minha vida comigo.                            

Em 1971 isso se realizou na pessoa de Marise, uma jovem amiga da família que perdeu a madrinha que a abrigava e veio morar conosco. A presença de Marise trouxe um alento para minha vida durante todo o tempo em que ela morou conosco. Até então, eu que sempre estivera sem uma pessoa para dividir meus segredos, finalmente tinha alguém para dividi-los juntamente com minhas mágoas e minhas tristezas. Mas durante o tempo do desenvolvimento de nossa amizade tenho mais alegrias que tristezas para recordar. Posso afirmar sem duvidar que foi a melhor fase da minha juventude. Ela entendia tudo o que eu sentia. Ter alguém jovem em casa, além de mim, fazia muita falta.                                                                                                                    

Dividimos muitas histórias interessantes juntas, mas, a que gosto mais de recordar era o papel social que nós representávamos naquele nicho: Quando havia um convite para algum evento social, fosse aniversário ou similar, e ninguém da casa queria ir, então eu e Marize, éramos autorizadas a comparecermos como legítimas representantes da família como nós mesmas, ironicamente, nos intitulávamos. Na maioria das vezes até que nos tratavam razoavelmente bem. Mas houve uma festa que ficou inesquecível para nós. Foi no bairro de Brotas. Passamos boa parte da festa completamente ignoradas.  As bandejas eram alçadas ao alto quando chegávamos perto. Até que mais tarde meu primo, filho legítimo da família, chegou à festa e, informado do que estava acontecendo, confirmou com a dona da casa a legitimidade da nossa presença. No dia seguinte um dos familiares foi lá em casa desculpar-se pessoalmente com meu tio, marido de minha tia, pelo desagradável acontecimento. Meu tio era um homem muito estimado por todos pela sua conduta irrepreensível dentro e fora de casa.

Marise constituiu família e eu também segui meu rumo, pois viver era preciso. Mas, até hoje, ela faz parte de uma fase da minha vida que vale a pena recordar. Amigo tem cinco letras. Dá para formar uma mão e, como uma mão lava a outra, tê-la como amiga me ajudou muito naquela fase de incertezas da juventude. Também, sempre a cada tempo em minha caminhada, o Senhor tem providenciado a pessoa certa na hora certa para me acompanhar e me ajudar a virar a página.



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