domingo, 7 de junho de 2015

MEU DEUS ME AMA

“No amor não existe medo; antes o amor lança fora o medo [...]” (I João 4:18).

Foi nesses anos de muita luta e solidão que descobri algo que iria ser decisivo para a minha fé em Deus. Descobri que Ele me amava de forma especial. Hoje já entendi e sei que Ele ama a todos da mesma maneira. Mas, na época,  esta “presunção” ajudou-me a  suportar mais os picos de tristeza e solidão. Ele me provou que havia muitas coisas nessa vida difíceis de explicar... Mas muito boa de sentir.                                

Eis um exemplo: Por vários dias minha tia me dava certa quantia para que eu comprasse alguma coisa na volta da escola. Alguém me roubava este dinheiro na hora do recreio de vez em quando. Certo dia ela me entregou uma nota de Cr$5,00 (cinco cruzeiros) e mandou-me ter cuidado com o troco.  Já era quase noite e eu não tinha coragem de voltar para casa. Quando finalmente apareci contando que haviam  me roubado na escola ninguém acreditou voltei para procurar, mas, procurar mais o quê? Como? Sai para andar a esmo sem saber o que fazer. Lá adiante, na frente do Colégio Dois de Julho, ao longe, nem quis acreditar no que vi. O vento assolou uma nota de Cr$5,00 e esta ficou presa entre as grades do portão. Corri, peguei o dinheiro e voltei para casa. Ninguém acreditou em meu relato. Mas até hoje, quando passo em frente aquele portão que dá acesso à entrada do colégio Dois de Julho fico a imaginar: Que Deus é este?!  E como Ele me ama! Isso é muito gostoso de sentir.

Pouca coisa passava despercebido aos olhos perspicazes de minha tia. Quando eu ia, ela já vinha. Ternura não era a marca registrada da família, contudo, em termos materiais, não me deixavam faltar nada. Meu tio era provedor. O homem mais íntegro e sério que já conheci. Em caso de doença também eu não era tratada com negligência.  Não fosse assim eu teria sucumbido na minha menarca. Minha primeira menstruação evoluiu para uma hemorragia quase fatal. Depois de trinta e um dias eu já não tinha mas nada expelir e desmaiei em cima de fogareiro. Minha tia me socorreu a tempo. Não houve medicamento que estancasse o sangramento e eu fui parar no Hospital da Clínicas (HUPES). Ninguém acreditava que eu fosse sobreviver. Fiquei muito fraca.
Aos doze anos, mais ou menos, as pessoas que tinham contato direto comigo, principalmente professores, começaram a ter que trabalhar várias demonstrações de meu comportamento que indicavam que algo não ia bem comigo.  Além do temperamento forte, a questão da impulsividade e inquietude ficava cada vez mais acentuada em minhas atitudes e isso dificultava o meu aprendizado. Minha mente funcionava interagindo como uma antena captando todos os sinais a sua volta e isso dificultava meu aprendizado. Estudava até altas horas da noite junto com meu primo que se preparava para o vestibular, mas minhas notas não progrediam. E se progredia em um mês (as avaliações eram mensais) no outro eram um verdadeiro fracasso o que tornavam as estatísticas de meu desenvolvimento escolar em picos de altos e baixos constantes. Esses acontecimentos levou muita gente a me rotular de “burra”.  Isso me fazia muito mal e só ajudava a intensificar o quadro. E ainda para piorar, no caminho para alguma atividade na rua, eu sempre parava para acompanhar tudo o que acontecia no centro de Salvador e, entre 1964 e 1968, eu vi muita coisa que criança não deveria ver. Morávamos perto, não tinha como não acompanhar, embora, na época, eu não entendesse nada.
 Tudo meu era exagerado e quase incontrolável. Para comer, falar. Tudo meu era muito intenso. Os “entendidos” começaram a aconselhar: “Leve essa menina a um psiquiatra”. Minha tia me levou. Fiz vários exames e fui liberada como normal...

Mesmo assim minhas professoras sempre se queixavam de minha forte tendência à dispersão ou instabilidade de atenção, o que obrigava  minha tia a ter que comparecer frequentemente à escola por conta de solicitação das freiras que se encarregavam desse assunto no convento onde eu estudava.

Até hoje não consigo me desprender do hábito de desempenhar várias tarefas ao mesmo tempo. Minha personalidade, carregada de energia hiperativa, tem sido responsável pelas minhas maiores vitórias. Todavia, também tem servido de pano de fundo para a maioria de minhas decisões erradas. Por conta dessa ansiedade desenvolvi uma tricotilomania que me perseguiu por anos. Graças a Deus eu não arranco mais sequer um fio de cabelo. Não foi fácil deixar o vício, mas, também quanto a isso, eu já virei a página...


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